segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Epidemia de Cores – Uma reflexão sobre arte e liberdade

 Cartaz de divulgação do documentário   Foto: Divulgação

Hoje aconteceu a primeira sessão de longas gaúchos da 44ª edição do Festival de Cinema de Gramado, que contou com a exibição do documentário “Epidemia de Cores”, que relata o cotidiano dos pacientes da ala psiquiátrica do Hospital São Pedro, localizado em Porto Alegre. O longa acompanha o trabalho desenvolvido durante a oficina de criatividade do hospital, na qual os internos realizam trabalhos em pintura, escultura, escrita criativa, poesia e bordado.

O documentário foi filmado e produzido de maneira independente pelo diretor e antropólogo gaúcho Mário Eugênio Saretta.  Em mais de dois anos de filmagem, o diretor realizou as captações de imagem interagindo com os pacientes através de uma linguagem audiovisual ética e esteticamente sensível. “Eu fiz um trabalho de pesquisa no Hospital Psiquiátrico, então eu já conhecia bem o lugar antes de começar a filmar. O choque de realidade é constante. Eu filmei todo o documentário sozinho, sempre tentando respeitar a particularidade de cada paciente, tentando deixar eles a vontade com a presença da câmera. Porém, muitas vezes eu levei os equipamentos, mas não realizei nenhuma gravação, pois estava tentando respeitar o espaço deles. A realidade deles é algo que impacta a todos, quando encontramos aquelas pessoas sofrendo, mas ao mesmo tempo conforme convivi com os pacientes acabei percebendo o quanto eles se sentem felizes por conseguir se expressar através das oficinas de criatividade”, comentou Mário.

Os pacientes são incentivados a realizar pinturas nas paredes    Foto: Divulgação


A oficina foi criada 1990, inspirada na iniciativa da médica psiquiatra alagoana Nise da Silveira, que, em 1940, apresentou em um hospital psiquiátrico do Rio de Janeiro essa forma de tratamento humanizado em contraponto a métodos violentos como eletrochoques e lobotomia. Para realizar o documentário, o diretor captou imagens e realizou entrevistas ao longo de dois anos com pacientes, funcionários e voluntários que colaboram com a instituição. Essa proximidade e intimidade se refletem na abordagem delicada e respeitosa com que apresenta tanto os dramas de quem rompeu, alguns bruscamente, os laços com a sociedade, encarando junto ao desajuste mental históricos de carência e abandono, quanto a abnegada dedicação daqueles que os acompanham na rotina da expressão criativa — que é, como demonstrou Nise da Silveira, um eficaz canal de comunicação e reconexão desses pacientes com a vida que cerca. A paciente Solange, que tem o sonho de participar do Programa do Jô comentou sobre a experiência do tratamento ao longo dos anos, e disse que aos poucos está conquistando o seu lugar em meio a sociedade. “Faço questão de ser entendida, muita coisa foi perdida pelo não entendimento de ambas as partes,”declara Solange.

Solange comenta sobre o aprendizado nas oficinas    Foto: Divulgação


A trilha sonora do filme foi composta por Vinicius Corrêa. Ela é formada por músicas instrumentais, tendo como instrumento base o violão. Também foram apresentadas algumas canções de cantores famosos da música brasileira, cantadas pelos pacientes do local.

A paleta de cores do filme busca um contraste mais vívido, devido a opinião dos moradores do local que acreditam que o ambiente colorido ressalta a esperança e felicidade. O diretor utilizou as cores das próprias locações para nortear o seu controle de tonalidade. Isso reservou um  aspecto único para o longa, que se utiliza a todo o momento de closes de câmera nas paredes do ambiente, que contêm pinturas e poesias escritas pelos pacientes.

O filme nos transporta para uma realidade que não estamos acostumados a ver, causando inicialmente um conflito interno no telespectador. Aos poucos começamos a perceber o quanto aquelas pessoas estão se transformando e se libertando através das oficinas de criatividade. O longa revela como a arte teve um impacto decisivo na vida dos pacientes do Hospital São Pedro, servindo como um catalizador para o tratamento que estavam realizando.


Andrei Souza, acadêmico do 4º semestre de Jornalismo na Universidade Feevale e Héctor Mattos, acadêmico do 1º semestre de Relações Públicas da Universidade Feevale. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário